Como escolher um veleiro

Não é raro ver um veleiro grande e promissor abandonado em uma marina. Quando isso acontece, eu me pergunto por que e em que momento desmoronou o sonho de seu proprietário e, muitas vezes, a resposta é a mesma: comprou o barco errado.

Mas, como ter certeza que se está comprando o barco certo? O primeiro passo para o sucesso da compra é saber realmente o que se quer, ou seja, quais são as expectativas para aquilo que, com certeza, será um grande desembolso.

Você está planejando uma volta ao mundo, um cruzeiro de média distância pela costa brasileira, ou velejadas de volta ao mundo sem destino? Pretende disputar regatas competitivamente? Sua tripulação rotineira será composta de mulher e filhos, amigos, ou será um velejador solitário?

O segundo passo é conhecer as características do porto em que pretende deixar sua nova aquisição. Qual a profundidade mínima, possibilidade de retirada do barco da água e infra-estrutura para reparos e manutenção? Não deixe para descobrir que o "travelift" da marina de seus sonhos só "puxa" seis toneladas depois de já ter comprado um veleiro de oito. Depois, procure saber quais as condições de mar e vento da região em que irá navegar. A idéia de comprar um barco que veleje sob quaisquer circunstâncias pode ser uma ilusão.

Tenha em mente que todo veleiro, exceção feita aos construídos essencialmente para vencer regatas, está sujeito a um certo tipo de comprometimento. Um embate entre simplicidade e eficiência, velocidade e conforto, performance no contra-vento e calado aceitável. Combinar conforto, navegabilidade, estabilidade e performance com beleza estética, não é tarefa fácil, e não são poucos os projetistas que passam a vida buscando essa fórmula ideal.

É fato que todos querem um barco espaçoso e confortável, mas devemos lembrar que, na maioria das vezes, esse aumento de espaço se deu em função de uma diminuição de estabilidade e/ou navegabilidade. Saiba que não será fácil pesar os pontos altos e baixos de um veleiro simplesmente olhando para ele. Existe uma variedade enorme de fatores sutis de projeto que determinam o desempenho de um barco. Experiência certamente facilitará o trabalho de diferenciar um veleiro excelente de um meramente regular, de identificar um barco de difícil manejo ou lento em demasia.

Compreendidas essas questões você estará apto para começar o trabalho cansativo e dispendioso de procurar o barco certo para suas necessidades, e que caiba em seu bolso. Visite vários barcos, veleje em todos e vá, pacientemente, percebendo as diferenças e descobrindo aquele que melhor atende a suas expectativas.

Descubra qual é o seu número
O primeiro ponto a decidir é o tamanho, ou uma faixa de tamanho que nos interessa, por exemplo: a faixa dos veleiros de 26 pés, versátil e prática para velejadas rápidas. A faixa dos 32 pés, oferece a possibilidade de cruzeiros de média distância, navegando de Florianópolis ao Rio de Janeiro, em relativo conforto enquanto a dos 36 pés permite longos cruzeiros e até mesmo travessias oceânicas. Um 42 pés é um ótimo tamanho para quem pretende viver a bordo. Oferece espaço, segurança, facilidade de manobra e um custo de manutenção não muito alto. São poucos os portos, no Brasil, que levantam barcos maiores que esse.

Semi-novo ou 0km?
O segundo ponto a ser considerado é se a embarcação será nova ou usada. O maior problema no mercado brasileiro de veleiros novos é a falta de produto em estoque. E aqui é necessário uma mudança de atitude tanto da parte de quem compra como de quem vende. Os compradores devem compreender que um veleiro bem feito não pode ser barato, deve ser construído com materiais de qualidade e mão de obra especializada.

Os estaleiros devem ter em mente que o melhor marketing de um veleiro é ele próprio, que são poucos os interessados em comprar um veleiro no papel, a maioria quer ver o produto, senti-lo, navegá-lo. Eu acredito que a partir do momento em que os estaleiros construam barcos de qualidade, e os exponham nos salões náuticos do país, os compradores irão aparecer. O interessado em comprar um veleiro novo deve ainda levar em conta o custo dos equipamentos que ele terá que colocar no barco antes de sair ao mar: motor, âncoras, cabos, equipamento de segurança, rádio, bússola, etc...

Faça você mesmo
A opção de comprar um kit e construir você mesmo é uma característica do mercado nacional, dada pela falta de "barcos na prateleira". Uma opção a ser analisada com cuidado se a sua intenção é fazer longos cruzeiros. Quando a opção é um usado, uma dúvida que costumeiramente ocorre é se vale à pena desembolsar mais por um veleiro novo e bem conservado ou economizar na compra e gastar posteriormente em reparos e equipamentos. A minha escolha pessoal é a primeira: compre um barco mais novo e equipado. Se o orçamento é curto, diminua o tamanho do objeto desejado. E, principalmente, encontre um barco que lhe permita conhecer o prazer do velejar. Já tive muitos amigos que passaram meses correndo atrás de peças, mecânico, pintor, marceneiro, etc., enquanto seu sonho de singrar os oceanos esmorecia.

Evite dores de cabeça
Normalmente é o motor o grande causador de dor de cabeça, não cometa o engano de acreditar que um veleiro não necessita motor. Já vai longe o tempo em que se ancorava ao largo e o desembarque em terra era feito em batel. Embora, hoje em dia, exista tecnologia para recuperar um barco com osmose sem muitas dificuldades, o custo dessa recuperação deve ser abatido do preço da embarcação. Eu, antes de comprar um veleiro, o veria dentro e fora d'água.

Dicas e atalhos
Uma boa dica é procurar um proprietário que esteja saindo do ramo. Ele pode lhe deixará milhares de pequenas coisas, como cartas náuticas, pirotécnicos, peças de reposição, ferramentas, etc... No barco de um velejador que está comprando outro veleiro, o mais comum é encontrar buracos, onde até bem pouco tempo havia um equipamento interessante. É um acordo de cavalheiros que o que está parafusado pertence ao barco.

Lembre-se que um barco pequeno, leve e bem conservado, é bem mais fácil de vender que um barco grande e pesado e que, no quesito liquidez, um barco de fibra ganha longe de um de mesmo tamanho em madeira ou aço. Um Ranger 26, um Brasília 32, ou um Main 34, do começo da década de 80, não requer um grande desembolso e – com um pouco de paciência – pode ser encontrado em boas condições. Veleiros mais novos, necessitam, obviamente, de um investimento inicial maior: um Samoa 29, recém construído, um Delta 32, de 1998, e um Fast 360, ano 1995, são algumas das opções disponíveis no mercado.

Não se esqueça que quanto maior o barco, maiores os custos de docagem e manutenção. Um das dificuldades que o novo proprietário poderá encontrar é a falta de marinas, principalmente longe do eixo Rio – São Paulo. A verdade é que, da mesma maneira que necessitamos de veleiros de qualidade expostos nos salões náuticos do país, a costa brasileira necessita de marinas bem posicionadas, com infra-estrutura de abrigo e retirada de embarcações.

Fora do eixo Rio - São Paulo, na ausência de marinas, os iate clubes cumprem essa função, além de oferecerem algumas vantagens extras. Talvez a maior delas, seja a associação dos clubes, que permite, por exemplo, ao sócio do Iate Clube da Bahia frequentar o Iate Clube de Santos. O ponto negativo de um iate clube é a necessidade de se tornar sócio e o custo adcional da manutenção do próprio clube. De qualquer maneira, o custo com a guarda da embarcação não pode ser negligenciado. Relacione a marina ou iate clube mais próximo de sua casa, para não ter que passar várias horas dirigindo toda vez que quiser velejar. Compare os preços, que em geral estão vinculados ao tamanho da embarcação em pés, e veja a infra-estrutura que a marina ou clube lhe oferece. A questão da retirada do barco da água é de suma importância, já que todo veleiro deve ser levantado ao menos uma vez por ano.

Com relação à manutenção, o conselho é: do it yourself, ou seja, faça você mesmo. A mão de obra náutica especializada não pode ser barata, exige responsabilidade, competência e experiência, e não é fácil de ser encontrada. Assim, a melhor opção é que o proprietário da embarcação aprenda a mantê-la e conhecê-la. Possuir um veleiro é um hobbie extremamente prazeroso, velejá-lo com sabedoria um êxtase, mantê-lo faz parte da brincadeira.